Baptista Luz

06/12/2022 Leitura de 5’’

Atualização: Juros sobre Capital Próprio podem ser calculados de forma retroativa

06/12/2022

Os Juros sobre o Capital Próprio (JCP) são utilizados com bons resultados e ampla aceitação desde 1996. Diferentemente dos dividendos, que dependem da existência de lucros para sua distribuição, os JCP remuneram investimentos na atividade empresarial independentemente do sucesso do negócio. Como regra, pagar JCP gera uma economia fiscal de 19% para empresas no Lucro Real: diferença entre a alíquota de 34% de IRPJ/CSLL (economizados via dedução dos JCP) e o IRRF de 15% que é devido no seu pagamento.

Esse instrumento jurídico sofreu tentativas de supressão por projetos de reforma tributária, que foram fortemente repudiadas pelo mercado, pois os JCP são uma ferramenta-chave de fomento ao mercado de capitais e de atração de investimentos, inclusive externos. Assim, a necessidade dos JCP é atual e encontra sólidos fundamentos.

Os JCP visam a remunerar o custo do dinheiro no tempo do investidor que aporta capital ao negócio. Têm a função de combater o viés tributário de financiamento corporativo via dívida (pro-debt tax bias), já que os juros cobrados sobre dívidas são dedutíveis. Os JCP também ajudam a evitar um grau de endividamento artificialmente elevado e promovem maior neutralidade na estrutura de capital, que deve ser definida por fatores de mercado, não tributários.

A lei determina que os JCP serão calculados pela TJLP sobre as contas do patrimônio líquido (PL) da investida. Além do cálculo, há uma condição a cumprir para sua dedutibilidade fiscal: o JCP é limitado ao maior valor entre 50% dos lucros acumulados mais reserva de lucros ou 50% dos lucros do exercício.

Caso uma empresa não tenha atingido tais condições em um exercício, mas as atinja no futuro, e neste exercício futuro delibere o pagamento de JCP, poderá reconhecer e deduzir a despesa de JCP calculada em relação ao PL de exercício(s) anterior(es)? A resposta é positiva. A lei tributária não disciplina detalhes operacionais dos JCP, limitando-se a fixar, exaustivamente, as premissas para que os JCP sejam tratados como despesas dedutíveis: a sua forma de cálculo e a limitação objetiva do valor a ser pago.

Tais requisitos legais são taxativos, não podendo ser ampliados pelo intérprete ou por atos infralegais. Observados os limites da lei, não há vedação a que os JCP tenham por referência PL de exercício(s) anterior(es). Essa forma de apropriação funda-se, ainda, na autonomia da vontade e na liberdade econômica. O Fisco, entretanto, questiona essa possibilidade, alegando: infração ao regime de competência; preclusão da opção; e excesso aos limites legais.

Sobre o regime de apropriação, deve-se fazer a correta imputação temporal das despesas incorridas. Sem regra específica, as despesas de JCP devem ser reconhecidas sob o regime de competência. O reconhecimento de despesa requer a prévia constituição da obrigação no patrimônio do contribuinte. A obrigação de pagar JCP não decorre da lei, mas da manifestação dos órgãos deliberativos da pessoa jurídica. A obrigação da empresa e o direito dos acionistas só nascem com o registro da despesa na escrituração contábil, em contrapartida ao passivo exigível. Assim, as despesas de JCP devem ser reconhecidas e deduzidas no período em que exercida a opção, independentemente do efetivo pagamento ou período de cálculo.

Sobre a extemporaneidade, o Fisco entende que, por ser opcional, a não-deliberação no próprio exercício implicaria a perda desse direito. Porém, esse não é um requisito, legal ou contábil, para dedução dos JCP, e não se pode criar uma ilegal decadência ou preclusão temporal para o exercício de direitos assegurados pela legislação tributária.

Sobre os limites, é incabível falar em excesso, desde que haja “cap” suficiente, ou seja, que os JCP estejam dentro dos parâmetros legais.

Em fins de 2021, a CSRF (Câmara Superior de Recursos Fiscais) ratificou a legalidade do cálculo retroativo dos JCP, entendimento que vem sendo acatado, conforme recente decisão da 1ª Turma em sessão de 13.07.2022. O STJ também entende inexistir na legislação fiscal obrigação de dedução pro rata temporis: respeitados os limites legais, a competência é a do exercício da deliberação, podendo o cálculo tomar por base o PL de exercícios passados. Este entendimento foi fortalecido em 25.10.2022 por nova decisão da 2ª Turma da CSRF, no processo nº 16327.720856/2018-90, que acompanhou a jurisprudência favorável ao contribuinte já estabelecida pela 1ª Turma, no sentido da dedutibilidade dos JCP apurados em relação a períodos anteriores.

Em conclusão, não existe restrição legal e há amparo em fortes precedentes administrativos e judiciais para pagar JCP de forma “retroativa”, aplicando-se a TJLP sobre PL de exercícios anteriores. A deliberação da distribuição, e seus efeitos contábeis e tributários, podem ocorrer a qualquer tempo, inclusive sobre o PL de exercícios anteriores a 5 anos, pois não há decadência ou prescrição. Deliberado o pagamento, a despesa deverá ser computada e deduzida integralmente no exercício da deliberação. A tese sobre a dedução retroativa dos JCP adquiriu recentemente ainda mais segurança jurídica, pois a 2ª Turma do STJ, ao analisar os REsp 1.955.120 e 1.946.363 em 22.11.2022, reafirmou que a pessoa jurídica pode fazer a dedução da base de cálculo do IRPJ e da CSLL dos JCP calculados retroativamente.

*Informativo atualizado em 1º de dezembro de 2022, para incluir novas decisões da CSRF e do STJ.

Alexandre Freitas é sócio na área tributária e CFO do B/Luz. Bacharel em Direito pela PUC-SP. E-mail: alexandre@baptistaluz.com.br.

Paulo Penteado Neto é sócio na área tributária do B/Luz. LL.M. por Harvard, Bacharel em Direito e MBA pela USP e Bacharel em Administração pela FGV-SP. E-mail: paulo.penteado@baptistaluz.com.br.

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