O Conselho Federal de Corretores de Imóveis (COFECI) estabeleceu recentemente, por meio da Portaria-COFECI Nº40/2024, a política de preços do Banco Nacional de Negócios Imobiliários – Sistema de Governança e Registro (BNI-SGR), que deverá ser implementado no próximo ano. O BNI-SGR permitirá o registro de contratos e documentos imobiliários em blockchain por corretores de imóveis e imobiliárias inscritas no sistema COFECI-CRECI, incorporadoras credenciadas junto ao SGR e instituições financeiras com atuação no mercado imobiliário.
A blockchain, registro digital descentralizado de transações armazenadas em blocos interconectados, oferece vantagens significativas para o mercado imobiliário, permitindo a criação de registros de transações imutáveis e transparentes, facilitando a verificação de propriedade, autenticidade das transações e diminuindo as chances de fraudes. Assim, a tecnologia aumenta a confiabilidade na integridade dos dados relativos às transações, promovendo a segurança jurídica. Além disso, a tecnologia permite a criação de soluções de automatização de diversas tarefas, como a assinatura de contratos e a transferência de pagamentos, podendo, no futuro, agilizar o processo de compra e venda de imóveis e reduzir custos para os envolvidos.
Por meio da Portaria COFECI Nº40/2024, o COFECI divulgou as tarifas de algumas funcionalidades oferecidas pelo BNI-SGR, como a utilização de contratos inteligentes de corretagem, o registro de instrumento de financiamento com garantia real em blockchain e a conversão de documentos em contratos inteligentes com registro na blockchain do SGR. Esse movimento viabiliza a utilização de contratos que executam automaticamente as obrigações neles contidas mediante pagamento. Além disso, a Resolução-COFECI Nº 1.487/2022 prevê uma série de funcionalidades para o SGR, como o Registro de Documentos Imobiliários (RDI), que permite o registro e autenticação de documentos imobiliários e o Registro de Ativos Digitais (RAD), que permitirá a autenticação de direitos imobiliários relacionados a imóveis registrados no SGR.
Ainda assim, a utilização da tecnologia blockchain nas transferências de imóveis depende de alteração legislativa, por envolver registro público e competências exclusivas de cartórios, nos termos da Lei n.º 6.015 (Lei de Registros Públicos). Por ora, o mercado imobiliário aproveitará dos benefícios do blockchain, somente na implementação de contratos de corretagem, que depende apenas de regulação do COFECI e consonância de entendimentos entre o conselho, os corretores e os clientes. Isso significa que, do ponto de vista dos registros públicos, inerentes ao mercado imobiliário (como escrituras, matrículas e outros documentos públicos), a amplitude das novas tecnologias será limitada, se não houver alterações legislativas que regulem a interface entre os registros públicos, cartórios de imóveis, proprietários, corretores e instituições financeiras.
Já em relação ao registro de operações imobiliárias em blockchain, é necessária cautela. Em 2021, tentou-se registrar a escritura pública da permuta de um imóvel utilizando-se tokens representativos de sua propriedade na blockchain de uma empresa privada. Na oportunidade, a Corregedoria-Geral da Justiça do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul entendeu, no Provimento Nº038/2021 que a escritura poderia ser lavrada, desde que com declaração de reconhecimento do conteúdo econômico dos tokens pelas partes e do reconhecimento de que eles não representam direitos sobre o próprio imóvel permutado, nem deem a entender que o registro em blockchain se refira aos direitos de propriedade sobre o imóvel permutado. Nesse sentido, não houve equivalência entre a “propriedade digital” dos tokens e a propriedade direito real de propriedade, mas tão somente direitos de caráter obrigacional entre as partes desse tipo de contrato.
Além disso, é possível que, no futuro, haja integração da blockchain do COFECI com o DREX, moeda digital do Banco Central do Brasil, o que permitiria a compra e venda de imóveis com contratos de corretagem automatizados. Isto pois, a utilização da plataforma do Banco Central possibilitará a realização de diversos tipos de transações financeiras com ativos digitais por meio de contratos inteligentes, os quais, por meio de dinheiro programável, poderão ser automatizados, reduzindo os intermediários e o tempo para sua execução.
Entretanto, a futura integração dos contratos inteligentes de corretagem com o sistema DREX ainda depende do lançamento e implementação do DREX, bem como de regulação específica do Banco Central sobre contratos inteligentes e o mercado imobiliário. No momento, o DREX encontra-se apenas em fase de testes com consórcios de instituições financeiras e empresas de tecnologia, permanecendo inacessível ao público em geral e pendente de regulação específica para tratar da utilização de APIs e plataformas de integração entre o DREX e contratos.
Ainda, durante a tramitação da PEC 65/2023, a qual trata da autonomia do Banco Central, os parlamentares apresentaram emenda para excluir da competência do Banco Central a regulação de serviços próprios da competência dos tabeliães e registradores atribuídos em lei, limitando, portanto, o poder de regulação do Banco Central para acelerar mudanças nos registros e mantendo a intermediação dos cartórios no mercado imobiliário.