Baptista Luz

24/05/2018 Leitura de 5’’

A participação variável em contratos de investimento em startups

24/05/2018

A maioria dos contratos de investimento em startups prevê a possibilidade de o investidor converter seu aporte em participação na startup. Assim, o investidor pode tornar-se sócio da startup, convertendo seu investimento em um certo número de quotas/ações da sociedade. Porém, aqui costuma ocorrer um grande impasse nas negociações: como definir antecipadamente o percentual ou número de quotas/ações a que o investidor terá direito? Para contornar esse problema, cada vez mais é utilizada a cláusula de participação variável.

Neste artigo, utilizaremos como exemplo o mútuo conversível, um dos contratos de investimento em startups mais usados atualmente[1], apesar da cláusula de participação variável também ser aplicável a outros contratos (ex. participação de investidor-anjo, opção de compra ou subscrição, AFAC). Entre as muitas cláusulas do mútuo conversível, a cláusula de participação variável é tida como “opcional” por muitos investidores, mas, apesar da sua complexidade, pode tornar mais justo o cálculo da participação societária do investidor na startup, ou ao menos facilitar o fechamento do negócio.

O empréstimo que o investidor faz à startup via contrato de mútuo conversível pode ser devolvido em dinheiro ou convertido em participação societária. O momento em que isso ocorre é a data de vencimento do mútuo prevista no contrato ou antes, se ocorrer um “evento de liquidez”, que pode ser estipulado livremente pelas partes do contrato. O evento de liquidez pode ser, por exemplo, um novo round de investimento da startup, aumento do capital social, compra de controle da startup, etc.

Quando o mútuo atinge a data de vencimento ou, na ocorrência de um evento de liquidez, não existe uma cláusula de participação variável, costuma-se aplicar conversão por participação fixa. Na participação fixa, o investidor obtém um percentual ou número fixos de quotas/ações da sociedade (ex. 10% do capital social ou 2 mil ações). Isso significa que o investidor terá direito à participação societária que foi antecipadamente prevista no contrato, comumente também chamada de “participação de referência”. Dependendo da trajetória da startup desde a assinatura do contrato, ou das premissas que foram consideradas inicialmente para chegar à participação de referência (ex. valuation, expectativa de novos investidores), essa participação por percentual ou número fixo pode se demonstrar baixa ou elevada demais.

Por outro lado, quando há no contrato uma cláusula de participação variável, isso significa que, na ocorrência de um evento de liquidez, a participação a ser adquirida pelo investidor irá variar de acordo com um cálculo, e não um número fixo previamente determinado. Esse cálculo pode levar em conta diversas variáveis, incluindo desconto e valuation considerado no evento de liquidez.

Agora, vamos observar e explicar como funcionaria a fórmula de participação variável do modelo SAFE Brasil, aplicável na ocorrência de um evento de liquidez, como o recebimento de uma nova rodada de investimentos pela startup:

Fórmula participação variável

Fórmula detalhando que Participação menos Alvo (&) é igual a Valor do Mútuo divido pelo Valuation de Terceiro vezes um menos o desconto

Explicando cada uma das variáveis:

Valor do Mútuo: é o valor recebido pela startup no contrato de mútuo com o investidor.

Valuation de Terceiro: é uma estimativa do valor de mercado da startup que foi considerado no evento de liquidez. Assim, a utilização da participação variável posterga para o futuro a decisão sobre o valuation da startup. Tendo em vista que um valuation muito elevado diluiria demais o investidor, costuma-se utilizar um cap (teto), estabelecendo para a fórmula um valor máximo em que a empresa pode ser avaliada.

Desconto: é o percentual que será descontado do valuation. É uma forma de recompensar o investidor inicial, tendo em vista os maiores riscos por ter acredito no negócio em seu estágio inicial. É comum ser estabelecido em 20%.

Por exemplo, se o valor do mútuo for de R$ 100.000,00; o valuation, R$ 2.000.000,00; e o desconto, 20%, chegamos à participação do investidor de 6,25% com a seguinte conta:

participação menos alvo

Fórmula de participação menos o alvo

Se representássemos a participação fixa e a participação variável em um gráfico, teríamos o seguinte cenário exemplificativo, com a participação fixa sendo um número pré-estabelecido e a participação variável uma curva:

participação fixa e participação variável

Retângulo divido em 2 metades: uma detalha a participação fixa (percentual) e a outra a participação variável (através de um gráfico)

É importante frisar que outros cálculos de participação variável podem ser aplicados, conforme o interesse das partes, utilizando as variáveis da forma que acharem mais adequada. Há bastante espaço para criação, pois a legislação nacional não apresenta regulamento específico sobre esse tipo de cláusula.

Assim, introduzimos essa ferramenta que, se usada com estratégia e criatividade, pode tornar a conversão dos mútuos em participação societária mais justa. Caso tenha alguma dúvida sobre o contrato de mútuo conversível ou outras formas de investimento em startups, não deixe de consultar nossos outros materiais sobre o assunto.

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