O segundo artigo da série Semeando Diversidade traz uma convidada que pertence ao ecossistema de startups e fala como acelerar a inclusão de mulheres no setor.
Do trabalho assalariado ao empreendedorismo
De acordo com o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), se nós conseguíssemos igualar a participação de homens e mulheres no mercado de trabalho da América Latina, o PIB regional aumentaria em 16%. Por outro lado, de acordo com a OIT (Organização Internacional do Trabalho), as mulheres são mais propensas a estarem desempregadas que os homens, na América Latina a taxa de desemprego masculina é de 6,8% enquanto que a feminina é de 9,5%.
Alguns fatores já bastante discutidos na academia, como discriminação, barreiras para conciliar a vida familiar e a falta de perspectiva de crescimento, ajudam a explicar o fato de que as mulheres deixam empresas. Porém muitas delas não estão fazendo isso para ficar em casa, mas sim para empreender.
O GEM (Global Entrepreneurship Monitor) mostra as mulheres já eram responsáveis por 51,5% dos novos negócios criados no Brasil em 2016. Quando se olha para empresas mais antigas, com mais de 42 meses de existência, os homens representam 57,3% do total. Essa diferença na representação de mulheres em negócios novos e em empresas já estabelecidas aponta que a desigualdade de gênero no empreendedorismo pode não estar relacionada ao senso comum de que mulheres teriam menos ambição em ter uma empresa. Ao contrário, elas são ligeiramente maioria na criação de empresas. Porém algo acontece no meio do caminho que dificulta seus negócios estarem em pé 3,5 anos depois.
Desafios de ser fundadora de uma startup
Para desvendar esse fenômeno podemos começar pensando nos fatores importantes de fracasso para um empreendimento, de acordo com a CBInsights, que listou os 20 principais motivos para uma startup falir, os 3 primeiros são: não adequação do produto ao mercado, não ter dinheiro disponível em caixa e não ter a equipe certa.
Em termos de adequação ao mercado e montar um bom time, como parte de uma organização que acelera e investe em startups no mundo todo, a 500 Startups, posso dizer que o caminho para acertar nesses pontos é tão árduo quanto menos mentores e rede de apoio o empreendedor tiver. Isso porque a jornada empreendedora vai tratar necessariamente de testar, errar, testar de novo, aprender e começar e ciclo novamente e o fato de ter mentores, seja em um programa de aceleração, seja como investidores anjo ou parceiros aliados do negócio, faz toda diferença. A Kauffman Foundation aponta que cerca de metade das mulheres empreendedoras têm dificuldades em encontrar mentores e isso compromete a rapidez do aprendizado.
Já em termos de caixa disponível, a Kauffman também mostra que as mulheres começam negócios com cerca de metade do capital se comparado com homens. A barreira aumenta quando olhamos para busca por capital de risco, isto é, investimento em estágios iniciais do negócio. No setor de Venture Capital, que inclui os fundos que investem em startups, a Fortune mostrou que apenas 2% do total foi investido em empresas lideradas por mulheres.
Algumas pesquisas estrangeiras que expliquei aqui mostram que há vieses conscientes e inconscientes que influenciam em como as empreendedoras são avaliadas, corroborando para que estereótipos influenciem na obtenção do financiamento. Em uma pesquisa sueca, por exemplo, as mulheres receberam, em média, apenas 25% do montante requerido, enquanto os homens receberam, em média, 52%.
Se os desafios são reais e consistentes, mas a velocidade em que estamos ocupando espaços ainda é baixa e levariam muitos anos para atingirmos equidade de oportunidades em todos os âmbitos do empreender, o que podemos fazer para acelerar esse ritmo e construir aliados que entendam nossas necessidades específicas?
Como acelerar a inclusão de mulheres no setor
Motivos para falar de diversidade de gênero no ecossistema de startups não faltam, além da própria busca por equidade, a First Round, VC focado em investimento semente, mostra que os investimentos do seu portfólio em startups com pelo menos uma fundadora performaram 63% melhor do que os investimentos em equipes exclusivamente masculinas.
Ao olhar com atenção para os desafios da mulheres chegamos à conclusão de que deixar a cargo do status quo, isto é, deixar que as coisas caminhem como sempre caminharam não é uma opção se quisermos que mulheres desenvolvam todo seu potencial e ainda tragam retorno para os investidores e para a sociedade, por isso precisamos:
- Apoiar aceleradoras para desenvolver o empreendedorismo feminino em estágios iniciais, como por exemplo a B2Mamy, aceleradora que já impactou diretamente mais de 2 mil mulheres, formando uma rede entre empreendedoras, mentoras e empresas
- Ajudar a desconstruir vieses de seleção, buscando maneiras pró ativas de aumentar o pipeline de fundadoras para que fundos de investimento avaliem seus negócios
- Construir espaços inclusivos nas aceleradoras, como por exemplo ter uma sala de amamentação ou uma sala família, e conscientizar as pessoas, como a 500 Startups faz nos EUA
- Entender e investir em fundos com recorte de gênero, como o Female Founders Fund, que investe em empresas iniciantes e lideradas por mulheres
- Convidar mais mulheres para eventos do ecossistema, não é difícil encontrar painéis apenas com homens e essa falta de diversidade nos eventos contribui para a manutenção de poucos modelos em que as empreendedoras possam se inspirar
- Intervir quando presenciar atitudes que possam estar reproduzindo um estereótipo negativo sobre as mulheres e convidar para o diálogo, juntos e conscientes das desigualdades temos um maior potencial de impacto positivo no ecossistema!