Baptista Luz

30/03/2022 Leitura de 8’’

Jogando e apostando: perspectivas sobre um mercado promissor

30/03/2022

As apostas esportivas, jogos de habilidade e azar, estão há anos presentes na sociedade. Executadas das mais diversas formas, estas modalidades movem importantes investimentos e geram enorme engajamento do público. É por isso que, ao longo dos anos, diferentes tipos de abordagens regulatórias foram implementados sobre a prática. No presente artigo, vamos analisar a mais recente tentativa de regulamentação das apostas esportivas, jogos de habilidade e azar que está em curso no Brasil.

/ Definições e panorama de mercado

Em primeiro plano, é necessário definir os conceitos das práticas que aqui serão abordadas. As “apostas esportivas”, de acordo com a definição dada pela Lei n. 13.756/2018 são “apostas relativas a eventos reais de temática esportiva, em que é definido, no momento de efetivação da aposta, quanto o apostador pode ganhar em caso de acerto do prognóstico.”

Os “jogos de azar”, por sua vez, são definidos pelo Decreto-lei 3.698/41 como (i) os jogos em que o ganho e a perda dependem exclusiva ou principalmente da sorte; (ii) as apostas sobre corrida de cavalos fora de hipódromo ou de local onde sejam autorizadas; (iii) as apostas sobre qualquer outra competição esportiva (estando, este último ponto, em fase de regulação).

Já os jogos de habilidade não possuem definição em lei. Especialistas do tema definem que são jogos em que prevalecem as habilidades do jogador, seu conhecimento e capacidade analítica de dados históricos de resultados. No texto do PLP n. 202/2019 – que propõe a incidência do ISS sobre a exploração dos jogos eletrônicos – de autoria do senador Flávio Arns (REDE-PR), os jogos de habilidade são definidos como aqueles em que o resultado é determinado por habilidades mentais ou físicas do jogador. Nos jogos online, são exemplos de jogos “mentais” o pôquer e o xadrez; já os jogos de “habilidades físicas” são aqueles que dependem da perícia com o controle do console como, por exemplo, o joystick.

Em relação aos dados deste mercado, no âmbito dos jogos de azar, de acordo com os dados divulgados pelo Statista, estima-se que o mercado alcance o valor de US$ 92.9 bilhões de dólares até 2023, o que representa um crescimento quase dobrado, já que atualmente vale cerca de US$ 59 bilhões.

Na mesma linha, de acordo com a pesquisa “Sports Betting Market”, realizada pela Research and Markets, estima-se que o mercado de apostas esportivas deve atingir, em 2028, o valor de US$ 140.26 bilhões, o que representa uma expansão de cerca de 10.1% entre 2021 e 2028.

As projeções de crescimento elevadas se dão em razão de um conjunto de fatores como, por exemplo, a expansão da infraestrutura digital em todo o mundo, o consequente aumento de dispositivos com acesso à Internet e o volume e sucesso de eventos e ligas esportivas.

/ Regulação internacional

Nos Estados Unidos, a maioria dos estados optou por legalizar as apostas esportivas – que antes eram proibidas em boa parte do país – fazendo com que o número de usuários aumentasse de maneira massiva. Embora considerada legal, diversos estados impõem algumas limitações à atividade, como restrições de idade e dos locais que podem oferecer serviços nesse sentido.

Os países europeus, que comportam o maior índice de receita bruta em jogos de azar, ainda que integrem a União Europeia, são livres para legislarem a respeito das apostas esportivas. Em decorrência disso, não há uma posição uniforme do bloco a respeito da prática ser ou não legal. Na Itália, por exemplo, todas as formas de jogatinas são consideradas ilegais. O mesmo não ocorre em países como França, Finlândia e Alemanha, nos quais praticamente todas as modalidades da atividade são consideradas legais.

/ Regulação brasileira

A exploração de jogos de azar foi uma prática proibida no Brasil por mais de 70 anos, de modo que eram, inclusive, enquadradas no âmbito das contravenções penais, com pena de 3 meses a 1 ano de prisão e multa. As poucas exceções previstas na legislação conferiam ao Estado uma espécie de monopólio sobre o setor, uma vez que somente apostas em loterias e, em determinados casos, apostas em corridas de cavalo, eram permitidas.

Desde 2018, com a sanção da Lei n. 13.756/2018, esse cenário tem mudado. A nova lei permite as apostas esportivas (“apostas de quota fixa relativas a eventos reais de temática esportiva”), possibilitando que a prática possa ser explorada pela iniciativa privada em ambiente concorrencial – antes, as apostas esportivas eram classificadas como uma modalidade de jogos de azar e, por isso, consideradas ilegais. Vale mencionar que o novo diploma legal estabeleceu que o exercício da atividade pelo setor privado requer autorização do Ministério da Fazenda.

Um aspecto importante a ser destacado é que a lei não fixou regras de funcionamento para as apostas esportivas, apenas estabeleceu que o tema deve ser objeto de regulamentação em um prazo de até 4 anos. Diante disso, a Secretaria de Avaliação, Planejamento, Energia e Loteria do Ministério da Economia (SECAP) foi o órgão encarregado de elaborar o decreto para regulamentar a prática da atividade no Brasil. Embora ainda não o tenha publicado, e a prática siga desregulamentada no país – o que cria uma espécie de nebulosidade em torno de sua legalidade – até o momento a SECAP já realizou três consultas públicas sobre a questão e divulgou duas minutas (“Minuta 2019” e “Minuta 2020”) de decreto. As previsões indicam que o decreto oficial deve ser publicado ainda nesse ano.

À vista disso, é pertinente destacar dois aspectos fixados pela Minuta 2020, que já trazem uma prévia do posicionamento que pode ser adotado na efetiva regulação das apostas esportivas:

  • Foi estabelecido o limite de outorga de 30 licenças para operadores mediante processo licitatório na modalidade concorrência. Desse modo, as empresas interessadas em obter a licença para atuar neste mercado devem comprovar que possuem os requisitos mínimos de qualificação exigidos no edital (que será publicado na fase de licitação) – na Minuta 2019, o regime que havia sido estabelecido era o de autorização, o que aparentemente viabilizaria uma atuação mais expressiva da iniciativa privada, já que esta não ficaria restrita a um número limitado de operadores. A justificativa para a alteração do sistema de licenciamento, foi de que somente o modelo de concessão seria capaz de prever penalidades se cometidas improbidades pelos agentes operadores.
  • Diferente da Minuta 2019, que previa que o operador da modalidade lotérica de apostas de quota fixa deveria constituir reserva financeira própria no montante de R$6 milhões para se resguardar de possíveis calotes, a Minuta 2020 não fixou um montante mínimo para constituição de reserva financeira.

Em paralelo, outros projetos e discussões vinculados ao setor tem avançado entre as autoridades – especialmente em razão da proximidade da Copa do Mundo de 2022, em Qatar. O Projeto de Lei n. 442/91, por exemplo, cujo texto-base já foi aprovado na Câmara dos Deputados, propõe a legalização dos jogos e apostas em todo o território nacional. Os argumentos favoráveis para a aprovação do PL são de que estas atividades já são amplamente praticadas no país, porém de maneira ilegal. Destacam, ainda, que com a regulação destas modalidades, diversos setores tendem a se beneficiar, como o turismo, cultura e economia.

A SECAP também elaborou outra minuta de projeto, que tem circulado entre as entidades governamentais, mas, nesse caso, direcionada a regulamentação dos jogos de habilidade no país. Ao que se sabe, o projeto pretende fixar regras mínimas que devem ser cumpridas pelas empresas que atuam no setor, bem como criar uma taxa para que a fiscalização possa ser realizada.

Como vimos a maior parte das inciativas legislativas ainda são bastante embrionárias. Diante disso, destacamos abaixo três pontos considerados sensíveis, sob o prisma regulatório, e algumas ponderações em relação a eles:

  • Tributação: é importante que a tributação, seja ela direcionada ao operador ou ao apostador, seja estruturada nas proporções corretas, uma vez que, caso imoderadamente onerosa, poderá afastar os investimentos e arrecadações do setor.
  • Monitoramento e integridade da prática: a Minuta 2020 da SECAP fixa que os operadores de apostas esportivas deverão manter um provedor independente e idôneo de monitoramento, que preencha os requisitos estabelecidos pelo Ministério da Economia. Trata-se de uma exigência de extrema importância, que se fundamenta na necessidade de os players cooperarem entre si a fim de assegurarem a identificação e combate de práticas ilegais e manipulações.
  • Publicidade: é importante que quaisquer divulgações da atividade promovam e estimulem a conscientização, responsabilidade e combate contra práticas ilegais, bem como, que se atentem às orientações já descritas no Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária do Conar.

As informações expostas nos permitem reconhecer que, caso as apostas esportivas e jogos de habilidade sejam regulamentados de maneira equilibrada, uma série de benefícios econômicos ao país podem ser viabilizados, como a atração de investimento estrangeiro, aumento na arrecadação de impostos e geração de empregos. Contudo, é importante que os aspectos acima destacados sejam levados em conta, para que um equilíbrio de mercado se torne possível.

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