Baptista Luz

06/04/2021 Leitura de 14’’

Os 10 erros jurídicos cometidos pelas Startups

06/04/2021
  • 14’’

Construir uma Startup é uma tarefa desafiadora. Entender os principais erros jurídicos e como evitá-los é o primeiro passo para evitar complicações futuras.

 

  1. Não regularizar a relação com seus sócios

Se você tiver co-fundadores, é importante esclarecer e estabelecer os parâmetros que vão reger a relação entre os sócios. Utilizar um modelo padrão do contrato social e não ter um bom acordo de sócios pode causar problemas legais significativos no caminho.

O contrato social pode ser considerado como a certidão de nascimento da empresa. Nele constarão algumas informações obrigatórias como, por exemplo, endereço, objeto, dados pessoais dos sócios, políticas de distribuição de lucros, tipo societário e outras exigências previstas em lei[1]. Outras cláusulas poderão constar nesse documento, no entanto é importante lembrar que o contrato social deverá ser registrado na junta comercial e, por isso, as informações contidas nele serão públicas.

Por isso utiliza-se outro documento para detalhar como se dará a relação ente os co-fundadores de uma startup, o acordo de sócios. Pense no acordo de sócios como uma forma de “acordo pré-nupcial”.

Um acordo de sócios serve como um guia de como a relação entre os co-fundadores funcionará no futuro, como sua empresa está estruturada e como cada sócio contribui para o negócio.

Aqui estão algumas das razões pelas quais esses contratos são essenciais:

 

  • Esclarecem o papel de cada fundador no negócio;
  • Estipulam medidas de resolução de conflitos entre os fundadores;
  • Protegem sócios minoritários;
  • Demonstram aos investidores o profissionalismo do seu negócio;

 

Esse documento é opcional, porém recomendável para a maioria dos negócios. É inevitável: estes documentos serão analisados em uma futura Due Diligence.

 

  1. Deixar questões contábeis em segundo plano

As startups precisam prestar atenção a uma variedade de questões fiscais importantes para seus negócios. Sem um planejamento adequado, os fundadores podem se responsabilizar por impostos, multas e penalidades.

Do ponto de vista dos investidores, uma startup organizada, regular e em dia com sua contabilidade é muito mais atrativa.

Um dos passos mais importantes que você tem que considerar é a abertura de sua empresa. Nos últimos anos, o valor de uma abertura de empresa tem diminuído por conta das simplificações implementadas. Além disso, se você não tiver um CNPJ terá que pagar o imposto de renda de 27.5% em vez de 6% (a partir de), o que significa dar quase um terço de seus rendimentos à Receita Federal.

Contratar um contador que saiba lidar com Startups é essencial, já que para cuidar das contas deste tipo de empresa, é preciso levar em consideração as projeções de crescimento, planos de escalar o negócio e possíveis aportes de investidores, por exemplo.

No mais, é importante que o contador consiga lidar com a imprevisibilidade, otimizar impostos e buscar maneiras mais benéficas de enquadrar a Startup conforme ela cresce.

 

  1. Investir na publicidade da marca antes de entrar com um pedido de registro

Uma marca é um dos bens intangíveis mais valiosos de uma empresa. Antes de investir em publicidade, é importante contratar um profissional experiente para realizar a busca de anterioridade da marca, bem como o estudo de viabilidade, e depois prosseguir com o registro junto ao Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI).

Investir em material publicitário antes de entrar com o pedido de registro pode ser arriscado, uma vez que a marca pode já existir e estar sendo utilizada por outra empresa, forçando o empreendedor a ter que investir ainda mais dinheiro na divulgação e publicidade de uma nova marca.

Sem registro de marca, é muito mais difícil convencer potenciais investidores a investir em uma Startup. Se você não acredita o suficiente em sua empresa a ponto de registrar uma marca, então por que um investidor deveria acreditar?

 

  1. Agir em desacordo com o CDC

Um dos modelos mais utilizados por Startups no Brasil é o B2C (“Business to Consumer” ou “Empresa para o Consumidor”), que é focado diretamente no cliente final.

Deste modo, levando-se em consideração que o relacionamento da Startup é diretamente com o consumidor, é importante que o empreendedor conheça os direitos básicos de seus clientes, bem como das principais implicações que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) pode causar no seu negócio.

O CDC considera o consumidor como agente vulnerável da relação de consumo, elencando, em seu artigo 39, uma lista exemplificativa de práticas que são consideradas abusivas, como por exemplo:

 

  • condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;
  • recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades de estoque, e, ainda, de conformidade com os usos e costumes;
  • enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço;
  • prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços;
  • exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;

 

Desta forma, resta evidente que a Startup deve estar atenta aos direitos do de seus clientes, principalmente quando adota o modelo B2C, a fim de evitar litígios judiciais capazes de causar prejuízos, financeiros e reputacionais, para empresas em estágio inicial.

 

  1. Não tomar medidas para proteger a Propriedade Intelectual da empresa

Se você desenvolveu um produto, tecnologia ou serviço único, precisa considerar as medidas apropriadas para proteger a propriedade intelectual de sua empresa. A falta de proteção de propriedade intelectual pode resultar em apropriação indevida, vazamento de know-how, concorrência desleal e até mesmo inviabilizar um negócio

A proteção conferida por meio dos institutos de propriedade intelectual é o que sustenta a inovação produzida, e é um dos principais pontos de atenção dos investidores.

Aqui estão algumas das medidas de proteção que podem ser usadas pelas startups:

 

  • Patentes: Patentes são a melhor proteção que você pode obter para uma invenção. Uma patente dá ao seu proprietário o direito de impedir que outros exploram, usem ou vendam a invenção patenteada por um tempo determinado.
  • Direitos autorais: Os direitos autorais abrangem obras intelectuais, como livros, artigos, música, filmes, software etc. O direito autoral independe de registro, e dá ao proprietário o direito exclusivo de explorar a obra por um determinado período.
  • Marcas: Uma marca é um nome ou símbolo utilizado para identificar uma empresa, um produto (bem de consumo), serviço ou comércio. O registro de uma marca é realizado pelo INPI e garante ao possuidor o direito exclusivo de utilizá-la dentro do território nacional.
  • Acordos de Confidencialidade: O objetivo de um acordo de confidencialidade é permitir que o titular de informações confidenciais (como o titular de um produto ou ideia de negócio) compartilhe certas informações de forma segura, obrigando a outra parte contratualmente a manter sigilo por um determinado período.

Outro potencial problema com relação à propriedade intelectual surge quando um fundador inicia uma nova empresa enquanto está empregado em outro lugar. Fundadores e investidores devem tomar cuidado para evitar alegações de uma possível concorrência desleal. Desta forma, é preferível encerrar uma relação empregatícia existente antes de fundar uma nova empresa.

 

  1. Negligenciar a LGPD

A Lei Geral de proteção de Dados (LGPD), criada para regulamentar o tratamento de dados pessoais por parte de empresas públicas e privadas, entrou em vigor no dia 18 de setembro de 2020. Um dos propósitos da LGPD é fornecer garantias aos indivíduos quanto à proteção de seus dados pessoais e seu direito à privacidade. A regulamentação passou a impactar profundamente como empresas operam, especialmente as empresas de base tecnológica que tratam um grande volume de dados pessoais, e mudou de forma radical como Startups recebem investimento.

Em suma, a LGPD determina parâmetros a serem observados por todas as organizações que fazem o tratamento de dados pessoais. Na rotina diária da Startup, uma série de elementos devem ser considerados, tais como:

  • Revisar termos de uso e políticas de privacidade;
  • Informar ao usuário para que suas informações pessoais serão utilizadas e como se dará o armazenamento dos seus dados;
  • Reforçar políticas de segurança;
  • Solicitar as autorizações necessárias aos usuários.

Implementar medidas de segurança transparentes para que os clientes exerçam seus direitos individuais (como o direito de ser informado, o direito de acesso, o direito de retificação dos dados) definitivamente ajudará na criação de confiança entre os consumidores. Isso, por sua vez, aumentará o compartilhamento de dados, pois os indivíduos garantirão acesso a eles, através do consentimento e portabilidade.

Observar a LGPD também minimizará os riscos de processos judiciais e multas em caso de incidentes de vazamento de dados pessoais de clientes, colaboradores e parceiros comerciais.

É importante mencionar que investidores já avaliam a maturidade dos projetos de adequação à LGPD antes de aportar nessas empresas. Deste modo, as startups devem ver a conformidade com o LGPD como parte de sua estratégia de negócios, sendo uma forma de se blindar juridicamente e de gerar confiança entre os investidores.

 

  1. Desconhecer as leis trabalhistas

Por normalmente contarem com um orçamento apertado, Startups frequentemente buscam meios informais de contratar funcionários, deixando de observar exigências trabalhistas, como a assinatura da carteira de trabalho. Em um país com uma legislação trabalhista robusta e complexa como o Brasil, desconhecer as leis trabalhistas pode causar sérios problemas judiciais para uma Startup.

As Startups, bem como todas as empresas, devem respeitar as normas da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) no momento da contratação do funcionário. Dentre as principais responsabilidades empregatícias, podemos citar:

  • Assinar a carteira de trabalho do funcionário;
  • Conceder folga e férias remuneradas;
  • Pagar o salário em dia;
  • Depositar o FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço;
  • Respeitar a jornada de trabalho do empregado;
  • Pagamento de hora extra, se a jornada de trabalho for extrapolada.

A fim de minimizar os custos com encargos trabalhistas, é comum que Startups optem por contratar funcionários como Pessoa Jurídica (PJ). Essa modalidade de contratação deve ser feita com cautela, a fim de que tudo ocorra dentro da legalidade.

Para fazer a contratação de uma PJ, um contrato de prestação de serviços deve ser firmado. Este acordo é regido pelo Código Civil e deve ser redigido cuidadosamente para que não se caracterize como uma relação de trabalho. É importante lembrar que essa modalidade de contratação exige o pagamento do prestador de serviços com a emissão de nota fiscal, mediante o recolhimento dos impostos previstos.

Deve-se ter em mente que, caso fique comprovada a pessoalidade, subordinação, onerosidade e, principalmente, não eventualidade, corre-se o risco de caracterizar o vínculo trabalhista, tornando o contrato de prestação de serviços inefetivo.

Caso a pessoa jurídica comprove na justiça a existência de vínculo, a empresa poderá ser obrigada a pagar todos os benefícios trabalhistas devidos de forma retroativa.

Uma estratégia utilizada por startups para contratar e reter bons funcionários pagando um preço abaixo do valor do mercado é optar por um contrato de vesting. Com ele, o funcionário de uma empresa, após um certo período de colaboração com o negócio (Cliff), ganha a possibilidade de adquirir gradualmente a participação de algumas quotas ou ações dessa organização.

É importante ter cuidado com eventuais riscos trabalhistas da adoção desta prática, principalmente em relação ao trabalho durante o período de cliff, para que o valor adicional não se confunda com o salário do trabalhador e acabe sendo integrado como parte da verba remuneratória. É por esta razão que se recomenda que o termo contratual de vesting seja elaborado por um advogado após orientações sobre as possíveis consequências da prática.

 

  1. Não ter um bom Termo de Uso e Política de Privacidade para o seu site

O Termo de Uso estabelece os termos e condições para as pessoas que usam o site de uma empresa. A política de privacidade é uma declaração legal no site que estabelece o que a Startup fará com os dados pessoais coletados de usuários e clientes e como esses dados podem ser usados, vendidos ou repassados a terceiros.

Um bom termo de uso e política de privacidade é capaz de diminuir a exposição legal que o empreendedor tem ao oferecer serviços em sua plataforma, também auxiliando na transparência e confiabilidade da Startup.

Um bom termo de uso trará, dentre outros pontos, o seguinte:

 

  • Como o site pode ser usado e os limites impostos aos usuários
  • Limites de responsabilidade do proprietário do site e de seus funcionários, diretores, afiliados e diretores
  • Como as disputas serão resolvidas
  • Direitos e garantias do usuário
  • Política de reembolsos e devoluções
  • Direitos de propriedade intelectual (por exemplo, direitos autorais)

 

Uma boa política de privacidade abordará, dentre outros pontos, o seguinte:

 

  • Quais informações o site coleta
  • Como o site usa as informações coletadas
  • Como as informações podem ser compartilhadas ou vendidas a terceiros
  • Como o site lida com crianças
  • Como o site pode ser acessado através de serviços de terceiros, como Facebook e Twitter
  • Uma descrição do uso de cookies e outras tecnologias no site
  • As medidas tomadas pelo proprietário do site para proteger a confidencialidade e segurança das informações coletadas

 

As políticas de privacidade não devem ser copiadas cegamente de outros sites. Elas devem ser adaptadas à situação específica do negócio para diminuir a exposição potencial do proprietário do site.

A empresa também deve considerar a LGPD e legislações correlatas no momento da construção da política de privacidade, a fim de abordar os principais pontos previstos em lei.

 

  1. Não ter um bom modelo de NDA (acordo de confidencialidade)

Uma maneira básica de proteger de uma empresa é através do uso de um acordo de confidencialidade. Esse tipo de acordo trata de questões de confidencialidade, mas também pode garantir que as ideias, produtos de trabalho e invenções que o funcionário cria que estejam relacionadas aos negócios da empresa pertencem à empresa — não ao funcionário. O NDA também facilita negociações e investimentos, uma vez que vincula as partes acordantes a respeitar o contrato celebrado.

Um bom acordo de confidencialidade pode proteger a Startup de ter informações cruciais vazadas. No entanto, é necessário que o NDA seja escrito de forma cuidadosa, a fim de especificar as situações que serão abarcadas pelo acordo. Um contrato muito genérico corre o risco de ser desconsiderado pelos tribunais, perdendo seu efeito vinculante.

 

  1. Não contar com um bom acompanhamento jurídico

Em um esforço para economizar em despesas, as empresas iniciantes muitas vezes contratam advogados inexperientes. Em vez de gastar o dinheiro necessário para contratar um advogado competente, os fundadores muitas vezes contratam advogados que são amigos, parentes ou outros que oferecem descontos de honorários. Ao fazê-lo, os fundadores acabam cometendo erros jurídicos que poderiam ser evitados com a contratação de um advogado com experiência na área.

Para lidar com todas estas questões elencadas, o mais aconselhável é procurar um acompanhamento jurídico adequado. Profissionais qualificados podem ajudá-lo a entender se falta alguma coisa no processo de constituição da Startup, o que pode estar errado com o modelo que você usou (ou as mudanças que você fez), e o que é arriscado adotar do ponto de vista jurídico.

Este artigo foi escrito em uma parceria entre o Baptista Luz Advogados e a Catarina Capital. Continue acompanhando nossas publicações para ver outros conteúdos produzidos em conjunto com nossos parceiros.

 

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NOTAS E REFERÊNCIAS:

Referências:

[1] Art. 997. A sociedade constitui-se mediante contrato escrito, particular ou público, que, além de cláusulas estipuladas pelas partes, mencionará:

I – nome, nacionalidade, estado civil, profissão e residência dos sócios, se pessoas naturais, e a firma ou a denominação, nacionalidade e sede dos sócios, se jurídicas;

II – denominação, objeto, sede e prazo da sociedade;

III – capital da sociedade, expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária;

IV – a quota de cada sócio no capital social, e o modo de realizá-la;

V – as prestações a que se obriga o sócio, cuja contribuição consista em serviços;

VI – as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade, e seus poderes e atribuições;

VII – a participação de cada sócio nos lucros e nas perdas;

VIII – se os sócios respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais.

Parágrafo único. É ineficaz em relação a terceiros qualquer pacto separado, contrário ao disposto no instrumento do contrato.

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