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A onda de investimentos ESG: uma necessidade mundial que veio para ficar
A sustentabilidade e a preocupação ambiental[1] são as novas chamadas para o investimento. Sob um panorama global, desde a década de 1970 o mercado vem sendo pressionado por diretrizes de políticas fincadas nos direitos humanos. Este debate foi introduzido pelo evento Desenvolvimento Sustentável das Organização das Nações Unidas (ONU), com o reforço das comunidades acadêmicas. Assim, essa preocupação evoluiu para aos chamados “negócios verdes”[2], empreendimentos preocupados com a forma correta de se fazer negócio, respeitando direitos básicos humanos e a questão das mudanças climáticas.
Esse conceito de negócio evoluiu para o termo Environmental, Social and Governance (ESG), ou em português, Ambiental, Social e Governança (ASG), ligado à Responsabilidade Social Empresarial (RSE), que tem impulsionado empresas que adotam essa postura a serem liderança em seus seguimentos. Adquirem vantagem competitiva, uma vez que o seu papel social passa a ser um alinhamento entre planejamento a curto e longo prazo, atreladas às comunidades em que estão inseridas. Ou seja, para empresas que querem se manter no pódio e continuarem inseridas nas demandas do Mercado, acompanhar as exigências e mudanças das políticas empresariais globais é a regra.
O desenvolvimento sustentável sai de uma esfera exclusiva das ONGs pra compor o interesse dos fundos de investimento. Neste sentido, uma companhia que não apresenta preocupação com os âmbitos sociais, ambientais e governamentais/gestão pode ficar a par dos debates.
Conforme explicita Kelman podemos pensar em três motivos para essa mudança de paradigma nos investimentos (antes apenas observáveis como rentáveis ou não). Primeira, a geração que chega a postos de comando teve educação mais voltada para as questões ambientais. Segunda, a pandemia disseminou a percepção de vulnerabilidade coletiva para a condição humana; se um vírus pode causar o estrago que está causando, o que dizer de uma irreversível mudança climática? Terceira, nos países desenvolvidos propõe-se o Green Deal, inspirado no New Deal, de Roosevelt, como uma das locomotivas para puxar a atividade econômica pós-pandemia. O objetivo é renovar a existente infraestrutura e remodelar o processo produtivo de uma nova forma, ambiental e socialmente mais sustentável.
Neste sentido, concebemos que avaliar a empresa como cumprindo bom comportamento nessas frentes se transformará em regra de mercado. A “função objetivo” do investimento deve a ser otimizada e é uma tendência mundial.
As cobranças vindas das instituições preocupam os investidores, que não querem correr o risco de apostar em negócios prestes a serem barrados por más estratégias. Eles estão preocupados com a segurança e alinhamento de seus fundos. Caminhando nessa linha, cabe refletir sobre como os investimentos de Venture Capital (extremamente importantes para o alavancamento das Startups já consolidadas) têm voltado sua atenção para empresas que se preocupam com a sustentabilidade. O que antes era uma informação adicional no momento de decisão do investimento, pode passar a ser um critério primordial para saber se determinada empresa terá futuro em meio as novas tecnologias e exigências sociais que reverberam seus impactos no Mercado.
Pesquisa da Consultoria e Auditoria EY mostrou que fatores não financeiros se tornaram parte fundamental do processo de tomada de decisão de investimento, no levantamento realizado com investidores institucionais, 97% afirmaram que realizam algum tipo de avaliação não financeira nas empresas candidatas a receber investimentos. Um exemplo dessa seleção de investimento, Larry Fink, CEO da BlackRock, uma das maiores investidoras do mercado, dirigiu-se a todos os CEOs com a carta confeccionou uma carta “Uma Mudança Estrutural nas finanças” , valendo o seguinte destaque:
“Os investidores estão cada vez mais considerando estas questões e reconhecendo que o risco climático é um risco de investimento. Na verdade, as alterações climáticas são quase sempre uma das principais questões que os clientes em todo o mundo abordam com a BlackRock. Da Europa à Austrália, da América do Sul à China, da Flórida ao Oregon, os investidores estão perguntando como devem ajustar seus portfólios. Eles estão procurando entender tanto os riscos físicos associados às mudanças climáticas, como também as formas pelas quais as regulamentações climáticas terão impacto nos preços, custos e demandas em toda a economia.”[3].
No Brasil, não é diferente, e aos poucos as empresas brasileiras incorporam valores ESG as suas práticas e objetivos com o intuito de se adequarem as novas exigências no mercado global.
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2.Mão na massa: Plano de Ação Sustentável e Relatórios
O planejamento estratégico na gestão e operações das empresas parece ser a melhor alternativa para adequação. Uma forma de operacionalizar essa demanda é a criação de um Plano de Ação voltado à Sustentabilidade, dentro do âmbito ESG. A partir do diagnóstico, passa-se a implementação dos pontos de melhoria identificados, para culminar com controles, processos e monitoramento, para permitir aprimoramento contínuo do sistema de gestão. A partir destas ações, será possível sintetizar todos os indicadores, resultados, metas e objetivos em um Relatório de Sustentabilidade.
O desenvolvimento desses relatórios e, por consequência, a implementação das boas práticas sustentáveis demandadas, possibilitará às empresas transparecer seu desempenho ambiental e estabelecer metas de melhoria contínua.
Sendo assim, pensar em um Relatório de Sustentabilidade passa a ser uma possibilidade de demonstrar todas as ações que a empresa tem tomado para ter um impacto positivo no meio ambiente, sociedade e economia.
Dentre o que deve estar descrito no relatório, a forma de gestão e organização das empresas que determina uma relação ética e transparente com seu público e clientes deve estabelecer metas empresariais que impulsionem o desenvolvimento sustentável. Estas diretrizes devem estar presentes em um documento que, além de detalhar as possíveis condutas empresariais que já são tomadas com estas finalidades, ainda propostas com prazos futuros de mudanças internas podem ser elencadas no documento.
Aderir essas pautas à organização e planejamento das empresas, sendo os relatórios de sustentabilidade a materialização das políticas de desenvolvimento sustentável, é essencial para manter relações ativas e dinâmicas nas novas gerações e oportunidades do Mercado Brasileiro e Internacional.
Uma pesquisa realizada pela KPMG em parceira com a NYSE Euronext no período de 2008 a 2010, intitulada “Riscos e Oportunidades do Desenvolvimento Sustentável” analisa a abordagem que o universo das empresas faz atualmente da pauta sustentável[4]. A maioria das empresas analisadas (93%), de um total de 24, respondeu que considera importante todos os temas relacionados com o desenvolvimento sustentável. Para 58% das empresas os riscos reputacionais e de imagem são os mais preocupantes quando pensando nos impactos gerados pela não preocupação com essa seara. Reputação ambiental é uma preocupação da metade das empresas estudas, demonstrando que a confiança ao fechar o negócio pode estar abalada caso se duvide da conduta da empresa eu recebe o fundo. Concluiu-se que a maioria das empresas cotadas vêm como principais oportunidades a capacidade de melhorar a imagem junto das comunidades, de melhorar a reputação e, portanto, de melhorar o desempenho operacional e a abordagem ligados ao risco.
3.Investimentos em ESG
Em uma publicação realizada pelo Blueprint, nomeada “A Blueprint for Responsible Investment”, foi possível perceber que mais de 75% dos signatários dos Principles for Responsible Investiment (PRI) seguem os critérios vinculados a ESG na gestão de seus produtos e nessa classificação de ativos. Discussão essa voltada para o mercado de private equity e venture capital. Essa é mais uma demonstração que exemplifica como funciona o processo competitivo de captação de recurso junto a investidores institucionais. Quando comparamos nosso desempenho no mercado de investimentos sustentável em relação ao mundo, percebemos que nossa colocação é satisfatória. “Cerca de 26% do mercado de investimentos já conta com algum tipo de estratégia de investimentos responsáveis, com destaque para a Europa e a região da Austrália/ Nova Zelândia, onde este número ultrapassa os 50%.”[5] Ao olharmos para o Brasil, apesar de não haver uma sistematização acerca da temática, a pesquisa realizada pela ANBIMA em 2016 evidencia que os ativos de private equity e venture capital são analisados a partir de critérios ESG por 22% de seus associados.
No decorrer das últimas décadas diversas estratégias foram criadas e são passíveis de serem analisadas como uma forma de adesão aos princípios ESG. Para a indústria de private equity e venture capital a de Fundos temáticos é a mais utilizada. Os fundos temáticos se resumem aos investimentos sustentáveis específicos que são destinadores a setores sociais ambientais determinados. Geralmente cobram questões relacionadas a mudanças climáticas, eficiência energética, florestas e água. Investidores com este foco buscam incentivar a transição para uma economia mais apoiada no desenvolvimento sustentável. Exemplos de fundos que pode ser citados são ClientEarth, Fern, Veblen Institute, FIDH e Fondation pour la Nature et l’Homme que vem pedindo uma discussão mais aprofundada sobre o impacto ambiental, social e econômico de acordos comerciais. Essa estratégia é a mais explorada porque ela (i) possibilita o desenvolvimento de produtos de segmento que são capazes de direcionar recurso para empresas setores ou empresas que desempenham uma contribuição positiva a partir dos preceitos da ESG, (ii) a integração, que considera aspectos ESG no processo de due diligence e monitoramento do desempenho das companhias investidas; e (iii) promove o engajamento, dada a influência que os gestores possuem sobre a formação do Conselho, diretoria e sobre as práticas de gestão das empresas.[6]
A linha de pensamento é entender que cada vez mais o investimento sustentável seja o investimento padrão. Foi o que Fiona Reynolds (CEO do Princípios para o Investimento Responsável) disse em um evento promovido pela XP, o Expert ESG.
4. Perspectivas atuais para ESG: como atualizar o investimento?
Repensar os princípios sociais, econômicos e ambientais é uma tarefa para o desenvolvimento de novos e antigos negócios que querem acompanhar as empresas globais. Essas modificações na preocupação do modelo de negócio e a consequente adesão as novas práticas requerem adaptações na gestão das empresas, e de preferência aderindo todos os conceitos e princípios da ESG.
De forma prática, as alterações devem vir em diversos âmbitos. Por exemplo, no quesito preocupação com o meio ambiente, as organizações podem desenvolver iniciativas como separação de resíduos, instalação/utilização de equipamentos energeticamente eficientes, programas de educação, formação e sensibilização em medidas “amigas” do ambiente e utilização de produtos reciclados. São esses os objetivos para a utilização ou consumo de recursos com impactos ambientais baixos. Já em complemento a essas atitudes, cabe lembrar que dentro das características presentes nas expectativas de uma empresa ESG está a observação com a comunidade em que está inserida. Assim, as políticas de igualdade podem compor os Relatórios de Sustentabilidade elaborados: pensar como dirimir políticas que segregam está em alta..
Sob esta perspectiva da implementação, vale ressaltar que os custos da adaptação empresarial para novas políticas já foram mensurados. Assim, o empresário pode se programar para transformar o seu negócio em um bom investimento para aqueles preocupados com estas políticas. A implementação dos fatores ESG enfrentam uma espécie de curva J, em que o montante despendido pode ser suportado no início, mas os benefícios são colhidos em longo prazo, se bem geridos. Quanto maior a intensidade da integração do ESG no modelo de negócio da empresa, menor a resistência no seu desempenho, de tal forma que eventualmente pode nivelar os custos aos benefícios, transformando-se em uma contribuição positiva.
Devido ao custo, devemos ser realistas: é necessário antes de implementar uma estratégia ESG, que os gerentes de investimento considerem os benefícios relevantes e os custos esperados. Isso deve ser um fator de atenção porque enquanto os benefícios potenciais são de longo prazo e podem ser difíceis de mensurar, os custos para aplicação das medidas são imediatos e reais[7]. É importante ressaltar, ainda, que quando observado o mercado neste momento de transição, essa empresa estará competindo contra outras que podem não estar integrando ESG e, portanto, sem custos nessa seara [Por outro lado terá acesso a uma fonte considerável de recursos para financiamento de suas atividades via Fundos ESG].
Portanto, do ponto de vista macroeconômico, é primordial que as empresas brasileiras voltem ainda mais a atenção aos diálogos com o mercado externo, principalmente no momento de reestruturação econômica pós-covid que viveremos em escala global. As instituições, grandes bancos e investidores estão dialogando e buscando uma saída para as perdas, fora dos pontos principais em debate, o Brasil precisa dançar conforme a música: os investimentos precisam se adequar para garantir que recebam fundos internacionais.
Referências
BRUNDTLAND, G. et al. Nosso Futuro Comum. Relatório da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento. Rio de Janeiro, FGV, 1988.
Btg Pactual. INVESTIMENTOS Investimentos sustentáveis: saiba o que são e como funcionam os fundos ESG! 2011. Disponível em: https://www.btgpactualdigital.com/blog/investimentos/fundos-esg. Acesso em: 30 mar. 2011.
CAVATTI, Felipe dos Santos. Relatório de Sustentabilidade” GRI (Global Reporting Initiative) para a Universidade Federal do Espírito Santo: estudo prospectivo sobre possibilidades de adoção. 2014. 142 f. Dissertação (Mestrado) – Curso de Gestão Pública, Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas Programa de Pós-Graduação em Gestão Pública, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2014. Cap. 1.
COSTA, Gabriela. Como transformar riscos em oportunidades? 2011. Disponível em: https://www.ver.pt/como-transformar-riscos-em-oportunidades/. Acesso em: 28 mar. 2021.
DIAS, R. Gestão ambiental: responsabilidade social e sustentabilidade. São Paulo: Atlas, 2011.
GUIMARÃES, C.; VIANA, L. S.; COSTA, P. H. de S. Os desafios da consciência ambiental: o marketing verde em questão. In: C@LEA – Cadernos de Aulas do LEA. n. 4, p. 94-104, Ilhéus – BA, nov. 2015.
NELSON, Mathew. Does your nonfinancial reporting tell your value creation story?: environmental, social and governance (esg) or nonfinancial factors have become integral to the investment decision-making process.. Environmental, social and governance (ESG) or nonfinancial factors have become integral to the investment decision-making process.. 2018. Disponível em: https://www.ey.com/en_gl/assurance/does-nonfinancial-reporting-tell-value-creation-story. Acesso em: 30 mar. 2021.
SPINA, Felipe. Como os fundos de venture capital incorporam critérios de ESG em suas decisões de investimento? 2020. Disponível em: https://distrito.me/esg-environmental-social-governance/. Acesso em: 30 mar. 2021.
TEIXEIRA, Carla João de Sousa. RELATÓRIOS DE SUSTENTABILIDADE: QUE FUTURO? 2011. 106 f. Dissertação (Mestrado) – Curso de Auditoria, Instituto Politécnico de Lisboa, Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa, Lisboa, 2011. Cap. 2.