Baptista Luz

22/08/2019 Leitura de 11’’

Série “Que contrato de colaboração é esse?” Franquia

22/08/2019
  • 11’’

Franquia é modelo de negócios que permite clientes e consumidores encontrarem as mesmas marcas nos mais diferentes lugares. Vamos falar de contrato de franquia, os riscos atrelados e as discussões envolvidas nesta modalidade contratual.

 

Conhecendo a figura da franquia

Em tempos de globalização, é cada vez mais comum encontrarmos os mesmos produtos ou serviços de determinadas marcas espalhados pelas mais diversas cidades e regiões do planeta. Isto pode nos deixar com mais uma dúvida: como é possível que os donos destas marcas atinjam essa capilaridade?

Em virtude da alta escala de comercialização de produtos e serviços e da necessidade nasceu o contrato de franquia, como forma de organizar a distribuição de produtos e/ou serviços[1].

O contrato de franquia é regulamentado pela Lei nº 8.955/1994, e apresenta como  partes o franqueador e o franqueado, além do subfranqueador e do subfranqueado.

O franqueador é aquele que cede o direito de uso de sua marca ou patente, enquanto o franqueado é quem explora esse direito, de maneira exclusiva ou semi-exclusiva. Além de ceder o direito de uso de sua marca ou patente, o franqueador pode ceder também o know-how relacionado ao seu negócio, ou seja, o conhecimento técnico, sistema operacional, e a expertise própria do negócio objeto de franquia.

Em contrapartida, o franqueado se obriga, por meio do contrato de franquia, a remunerar direta ou indiretamente o franqueador – mas sem que seja estabelecida entre as partes uma relação de trabalho, com vínculo empregatício[2].

Há também as subfranquias, considerando que os franqueadores podem conceder a um franqueado, o direito de exercer poderes, normalmente reservados a eles (franqueadores), em um território específico. Esse franqueado é chamado de subfranqueador, ou master franqueado (nome utilizado no mercado).

O modelo de subfranquia usualmente é utilizado em situações em que a marca busca expandir seus negócios em determinada região e queira contar com um suporte robusto e localizado. Neste contexto, a transmissão do know-how de implantação, operação e comercialização da linha de produtos ou serviços da marca será realizada pelo subfranqueador (franqueado master) ao subfranqueado.

Em contrapartida, o subfranqueador repassa à franqueadora um percentual de todas as taxas que recebe pela concessão de subfranquias.

 

E quais são os elementos essenciais de um Contrato de Franquia?

A relação de franquia tem uma característica muito própria: ao mero sinal de interesse na implantação de sistema de franquia empresarial, é obrigatório que o franqueador forneça ao interessado na franquia (ou seja, um potencial franqueado) um documento chamado Circular de Oferta de Franquia.

A Circular de Oferta de Franquia (COF) deve estar por escrito, com linguagem clara e acessível. Além disso, a COF deverá ser entregue ao candidato a franqueado pelo menos 10 (dez) dias antes da assinatura do contrato ou pré-contrato de franquia, ou ainda do pagamento de qualquer tipo de taxa pelo franqueado ao franqueador ou a empresa ou pessoa ligada ao franqueador.

Caso este requisito não seja cumprido, o franqueado pode alegar futuramente que o contrato de franquia é anulável e exigir devolução de todas as quantias já pagas ao franqueador ou a terceiros por ele indicados, a título de filiação e royalties, devidamente corrigidas, pela variação da remuneração básica dos depósitos de poupanças mais perdas e danos. Tal condição também se aplica caso o franqueador veicule informações falsas na Circular de Oferta de Franquia, podendo haver, inclusive, aplicação de penalidades criminais.

Existem inúmeras e extensas informações obrigatórias que devem estar contidas na COF[3]. São elas:

Uma vez apresentada a Circular de Oferta de Franquia, e estando todos os seus requisitos devidamente cumpridos, o franqueador e o franqueado podem finalmente firmar o Contrato de Franquia. Este contrato deve ser sempre escrito e assinado na presença de duas testemunhas, e é válido independentemente de ser levado a registro em um cartório ou órgão público.

Importante ressaltar que o contrato de franquia não poderá conter informações distintas daquelas encontradas na Circular de Oferta de Franquia.

 

A Associação Brasileira de Franchising e seu Código de Conduta para o setor

Como vimos, temos o marco legal da Lei de Franquias como norteador das atividades de franqueadores e franqueados. Além de lei especial, o setor possui uma associação específica, a Associação Brasileira de Franchising (ABF), criada em 1987 para promover e defender a franchising brasileiro e auxiliar a guarda e zelo das boas práticas e das condutas éticas do sistema de franquias, assegurando a diversidade neste sistema.

Assim, é crucial que os atores do setor de franquias incorporem as recomendações da ABF enquanto realizam suas atividades, para evitar riscos de violações de conduta e/ou uma celebração de contrato de franquia inadequada.

A Associação Brasileira de Franchising publicou um Código de Conduta e Princípios Éticos, orientados por princípios éticos que envolvem o sistema de franchising brasileiro.

Dentre os objetivos de seu Código de Conduta, a ABF defende a elevação do nível de confiança e de respeito mútuo entre os participantes do setor de franquia brasileiro, além de enfatizar a importância do contínuo aprimoramento educacional, cultural e profissional de todos os envolvidos em franchising e servir de referência para avaliação de eventuais violações das normas de condutas. Um quarto objetivo seria a defesa de imagem e reputação do sistema de franchising brasileiro.

Mas, afinal, o que seria uma conduta não adequada aos olhos da ABF e como franqueadores e franqueados devem se adequar ao Código de Conduta e Princípios Éticos deste órgão? Respeitando os princípios regentes da ABF, os quais impõem deveres às partes – quais sejam:  transparência, integridade, respeito e responsabilidade corporativa.

Neste espírito, o princípio da transparência atribui às partes:

 

  • a divulgação de informações claras, exatas e fiéis aos futuros e atuais parceiros, para que os riscos de cada investimentos possam ser concretamente;
  • não utilização de cópias ou imitações de marcas registradas, nome comercial, “slogan”, logotipo, qualquer outro traço de identificação ou outros direitos de propriedade intelectual pertencente a outra empresa, nacional ou estrangeira, que possam iludir ou induzir a terceiros interessados a erro ou engano;
  • prover os candidatos a franqueados com as informações indispensáveis para o processo de seleção e para o bom relacionamento entre franqueadores e franqueados em termos de direitos, obrigações, particularidades e correspondentes responsabilidades;
  • informar os planos ou decisões da ABF, que sejam de interesse dos públicos internos e externos, os quais deverão ser objeto de divulgação para, com isso, incentivar as contribuições de todos os participantes do sistema (a não ser que haja sigilo justificado);
  • considerar que as informações que a ABF possuir sobre seus associados, respectivos colaboradores, são confidenciais e sua divulgação para terceiros dependerá de expressa autorização dos envolvidos (a não ser casos disciplinados por lei); e
  • manter compromisso com a veracidade e tempestividade de todas as informações prestadas à ABF.

 

Ainda, a ABF cunhou os seguintes deveres, impostos pelo princípio da integridade:

  • conhecer, divulgar e cumprir a legislação que rege a atividade de franchising (Lei 8955/94), bem como as normas internas da ABF, entre as quais se incluem seu Estatuto Social e este Código, tendo em vista que a violação desses normativos poderá afetar seriamente as relações de negócio ou de trabalho entre quaisquer associados, seus diretores e colaboradores;

 

  • levar sempre ao conhecimento da ABF, através da Comissão de Ética, a ocorrência de violação de qualquer disposição deste Código, por qualquer dos associados, franqueados e seus diretores ou colaboradores;

 

  • não participar de atividades ou serviços incompatíveis com as boas práticas de franchising ou cujo modelo de negócio ou estrutura legal se revelem conflitantes com as normas do Código de Conduta e Princípios Éticos da ABF;

 

  • não realizar publicidade e divulgação de franquias, marcas, produtos ou serviços que contenham ambiguidades, ou sejam fantasiosas ou enganosas sob a perspectiva de potenciais franqueados;

 

  • utilizar de forma adequada a marca ABF, a chancela do SELO DE EXCELÊNCIA e outras chancelas e sinais distintivos da ABF;

 

  • reger seus negócios sempre buscando aplicar as melhores práticas do franchising e as melhores práticas de administração de negócios.

 

O princípio do respeito, por sua vez, impõe os seguintes deveres:

  • colaboração ativa na formação de uma cultura de respeito pelo sistema de franchising, por meio da atividade empresarial, pessoal ou profissional com princípios de sustentabilidade;

 

  • articulação de parcerias e condução de negócios em conjunto com stakeholders que também tenham, em suas práticas, princípios norteados por respeito ao meio ambiente, à pessoa e a sociedade;

 

  • respeito às boas práticas da concorrência, com firme oposição a aliciamento de franqueados, clientes e colaboradores de outros associados e oposição a invasão e canibalização de território;

 

  • assegurar as mesmas oportunidades para todos os envolvidos no sistema de franchising, respeitando cada categoria de associado.

 

Por fim, o último princípio regente da conduta dos franqueadores e franqueados, segundo a ABF, é a responsabilidade corporativa. Ela impõe os seguintes deveres:

 

  • utilizar sempre as melhores práticas de governança;
  • manter integração dos associados com ações sociais;
  • certificar a inexistência do trabalho infantil e forçado na cadeia produtiva; e
  • incentivar o empreendedorismo através da criação e realização de projetos, serviços ou negócios, produzindo inovações relevantes nas atividades dos associados, dedicando tempo e esforços, correndo riscos calculados e gerando lucro para o negócio e valor para a cadeia produtiva do sistema de Franchising.

 

São estabelecidas penalidades, de maneira gradativa, caso as condutas de franqueadores e franqueados violem os deveres impostos pelos princípios acima listados. A primeira delas seria uma comunicação de “não conformidade”, ao passo que a segunda seria uma advertência. A terceira forma de punição prevista pela ABF seria a suspensão do associado com conduta inadequada, e o quarto (e final) método de sanção seria a exclusão do membro infrator da Associação Brasileira de Franchising.

O processamento dos casos de descumprimento dos princípios éticos é da competência da Comissão de Ética da ABF. Especificamente, a sanção de exclusão será recomendada pela Comissão de Ética e aplicada pelo Conselho Diretor.

 

A relevância de Cláusulas de Não-Concorrência em Contratos de Franquia

A cláusula de não-concorrência nos contratos de franquia consiste em fator crítico de sucesso e deve estar presente tanto no contrato quanto na Circular de Oferta de Franquia – justamente por proteger o know-how da franquia, cedido ao franqueado pelo franqueador.

O que isso significa? Basicamente, cláusulas de não-concorrência protegem o segredo e a estrutura de negócio do franqueador, impedindo que o franqueado copie e reproduza este modelo de negócio com um nome diferente, configurando uma concorrência desleal.

Outro aspecto protegido por esta cláusula contratual é a própria rede franqueada, já que impede que ex-franqueados concorram de modo desigual, se aproveitando da mesma expertise que franqueados atuais, mas sem o ônus de pagamento de royalties ao fraqueador. É preciso que a franquia seja vista como forte e protegida, para que realmente haja incentivos para ingressão de novos franqueados[4].

A referida cláusula de não-concorrência deverá endereçar os seguintes aspectos: prazo de aplicação, território abrangido e o objeto, ou seja, o que está sendo protegido, tal como know-how do negócio. Adicionalmente, para que seja efetiva é preciso estabelecer um valor para multa por descumprimento, além de eventual indenização por perdas e danos decorrentes.

Contudo, vale relembrar que a cláusula de não-concorrência não é permanente . Ela apenas impede, por um tempo determinado, que um ex-franqueado aproveite a clientela de seu franqueador ou utilize o mesmo modelo de negócio em determinado local.

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