Baptista Luz

16/09/2020 Leitura de 7’’

Alterações Tributárias propostas no Projeto de Lei Estadual nº 529/2020.

16/09/2020
  1. Introdução

Em agosto de 2020, o Governo do Estado de São Paulo enviou para a Assembleia Legislativa o Projeto de Lei nº 529/2020 (PL 529). Com tramitação em regime de urgência e profundas modificações na legislação estadual, a reforma de cunho administrativo e tributário, se aprovada, poderá surtir efeitos na vida do contribuinte paulista a partir do início do ano que vem.

 

Na justificativa encaminhada à Assembleia, o Poder Executivo argumenta que o estado de calamidade pública provocado pela pandemia evidenciou as deficiências da Fazenda Pública Estadual e induziu ao agravamento da crise fiscal já existente. Neste cenário, o PL 529/20 é proposto objetivando o enfrentamento do déficit que se agiganta em razão do aumento de despesas causado pelas necessidades sociais e sanitárias, e a compensação da redução das receitas tributárias devido à crise econômica.

 

Em matéria tributária são propostas alterações em todos os impostos de competência do Estado: o Imposto sobre a Transmissão “Causa Mortis” e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD), o Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) e o Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS). Além disso, o texto prevê significativas mudanças na atuação da Procuradora Geral do Estado, e regulamenta a transação de créditos tributários e não tributários no Estado.

 

  1. Modificações tributárias propostas

ITCMD

 

Entre as alterações tributárias propostas no PL 529, o ITCMD foi o tributo que mais sofreu alterações. Foram propostas modificações em dispositivos legais relativos ao fato gerador do imposto, à sua base de cálculo, às hipóteses de isenção, responsáveis tributários, entre outros temas relevantes. Abaixo, seguem as principais mudanças propostas:

 

  • Na doação de bens com reserva de usufruto em favor do doador, o ITCMD deverá ser recolhido integralmente, tendo sido alterada a previsão anterior que permitia a redução de base de cálculo para 2/3 do valor do bem. Nas doações com reserva de usufruto realizadas antes da data de início da produção de efeitos da nova lei, em que houve o recolhimento do ITCMD sobre 2/3 do valor do bem, há previsão expressa de que na ocasião da extinção do usufruto, deverá ser realizado o recolhimento da parcela restante do imposto, correspondente a 1/3 do valor do bem.
  • Na transmissão de bens imóveis, o PL 529 altera a base de cálculo do ITCMD determinando que: (i) na transmissão de imóveis urbanos a base de cálculo deve ser o valor venal de referência utilizado para fins de ITBI, podendo ser utilizado o valor para fins de IPTU apenas na falta de indicação sobre o valor para fins de ITBI e desde que seja correspondente ao valor de mercado do imóvel; e (ii) para imóveis rurais a base de cálculo do ITCMD deve ser o valor venal divulgado pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento de São Paulo.
  • Nos casos de transmissão de participação societária não negociada em Bolsa em Valores, o PL 529 determina que a base de cálculo do ITCMD será o valor do patrimônio líquido, ajustado pela reavaliação dos ativos e passivos a valor de mercado.
  • Um dos pontos mais polêmicos do PL 529 relacionado ao ITCMD é a previsão da responsabilidade das entidades de previdência complementar e das sociedades seguradoras, pela retenção e recolhimento do ITCMD sobre a transmissão de valores e direitos relativos a PGBL e VGBL. O PL 529 determina, ainda, que referidas entidades devem prestar informações à Fazenda Pública sobre PGBL e VGBL sob sua administração;
  • Foi atribuída responsabilidade aos Tabelionatos de Notas para informar mensalmente à repartição fiscal a relação completa das doações registradas. Atualmente, apenas o oficial de Registro Civil é responsável por informar os óbitos registrados e a existência ou não de bens a inventariar.

 

IPVA

 

As principais modificações trazidas pelo PL 529 em relação ao IPVA, são: (i) revogação da alíquota diferenciada de 3% para veículos que utilizam como combustível álcool, gás natural ou eletricidade; (ii) fim da redução de 50% da alíquota de IPVA paga por empresas locadoras de veículos; e (iii) modificação do critério para concessão de isenção do imposto às pessoas com deficiência física. Para que seja concedida a referida isenção, o texto determina que o veículo deverá ser especificamente adaptado e customizado para a situação individual da pessoa com deficiência.

 

ICMS

 

Em relação ao ICMS, o PL 529 (i) autoriza a renovação de benefícios fiscais concedidos pelo Estado de São Paulo, desde que previstos na legislação orçamentária e de acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal, e (ii) a possibilidade de o Estado de São Paul reduzir o valor de benefícios fiscais e financeiros fiscais concedidos, nos termos do Convênio ICMS nº 42/16. Além disso, equipara a benefício fiscal a alíquota fixada em patamar inferior a 18%.

 

  1. Transação de créditos tributários e não tributários, e mudanças na atuação da Procuradoria do Estado em processos judiciais

 

Outra inovação trazida no PL 529 é a regulamentação da transação tributária prevista no art. 171 do CTN, que autoriza a transação entre o Estado e o contribuinte, mediante concessões mútuas, para quitação de saldo devedor.

Tal como já ocorre em âmbito federal, o Poder Executivo Paulista visa, por meio do PL, tornar possível a negociação para pagamento de dívidas ativas tributárias e não tributárias, visando a diminuição dos custos de arrecadação e cobrança e o aumento da receita do Estado no curto prazo.

Nesse contexto, o Estado estará autorizado a (i) conceder descontos nas multas e nos juros de mora de débitos classificados como irrecuperáveis ou de difícil recuperação (redução limitada à 50% para devedores pessoas naturais, microempresas ou empresas de pequeno porte, e 30% para os demais casos); (ii) instituir prazos (até 84 meses para devedores em recuperação judicial e até 60 meses para os demais casos) e formas de pagamento especiais, incluídos o diferimento, o parcelamento e a moratória; e (iii) autorizar a substituição de garantias e constrições.

A transação poderá envolver débitos tributários ou não tributários, desde que inscritos em dívida ativa, sendo vedada a transação: (i) que tenha por objeto a redução de multa penal e seus encargos; (ii) relativa a débitos de ICMS de empresas do Simples Nacional; (iii) que envolva devedor de ICMS que nos último 5 anos, tenha inadimplido com mais de 50% das suas obrigações; (iv) que reduza o montante principal do débito;  (v) que implique em redução superior a 30% do valor total dos débitos a serem transacionados; (vii) que conceda prazo de quitação dos débitos superiores a 60 meses; (viii) que prever reduções de juros ou multas para dívidas no gozo de benefícios fiscais; (ix) envolver o adicional do ICMS destinado ao Fundo Estadual de Combate e Erradicação à Pobreza – FECOEP; (vi) envolver, exclusivamente, ações de repetição de indébito.

Os depósitos judiciais de garantia de dívidas sujeitas à transação serão revertidos à Fazenda, mas precatórios, ordens de pagamento de pequeno valor, ou outros direitos do devedor, ainda que certos e exigíveis, não poderão fazer parte da negociação para liquidação de parte do débito.

Além da possibilidade de transação tributária, o PL também traz novas diretrizes para a atuação da Procuradora do Estado, com o intuito de concentrar os esforços do órgão em demandas mais estratégicas. No texto, fica estabelecido que os procuradores poderão, no bojo de processos judiciais, autorizar e reconhecer a procedência do pedido, abster-se de contestar e de recorrer, e até desistir de recursos já apresentados, em diversas situações, tais como quando a pretensão deduzida ou a decisão judicial estiver de acordo com súmula,  jurisprudência consolidada, ou com acórdão proferido em sede de controle de constitucionalidade, recurso repetitivo ou repercussão geral.


Veja também:

 

Direito Tributário e Tribunais Superiores: Retrospectiva das matérias já analisadas em 2020

Reforma Tributária do Governo Federal: Transformação do PIS /PASEP e da COFINS em CBS


 

Quer saber mais?

Entre em contato com os autores ou visite a página da área de Tributário

Mais lidas:

Mais recentes:

Assine nossa newsletter

Inscreva-se para receber informações relevantes sobre o universo jurídico e tomar decisões informadas que vão impactar seus negócios.

Nós respeitamos a sua privacidade e protegemos seus dados pessoais de acordo com a nossa Política de Privacidade.

Baptista Luz